dezembro 27, 2001

ASSASSINATO | Parte 2
Passei a noite pensando no que tinha visto. Aquela cena no quarto me chocou bastante. Não sei por que. Já vi gente morta de perto, mas ali era diferente. Não sei se a mulher me parecia familiar, ou era pelo tipo de morte, sei que estava chocado.
Fui para o jornal. Consegui chegar mais cedo dessa vez.
- Renato, recado pra ti.
- De quem?
- Tá anotado na tua mesa.
Era um bilhete do Ricardo dizendo pra eu ligar para ele.
- Fala Ricardo.
- E aí Renato. É o seguinte: novidades! Me encontra no Café da Duque às 11h, pode ser?
- Claro! Sobre a modelo?
- Isso. Depois nos falamos. Ah, e fica calado!
- Pode deixar. Um abraço!
Hummm, o Ricardo estava estranho. Deveriam ter descoberto algum suspeito ou até solucionado a porcaria.
11h. Nada do Ricardo. Fiquei meia hora esperando ele, tomando um café e lendo a Folha. Do nada ele aparece, com pressa.
- Renato, vâmo pro carro.
Chegamos ao estacionamento.
- Olha só, tô te devendo uma.
- Que isso?!
- É mesmo! Tu me quebrou um baita galho aquela vez. Agora é a minha oportunidade de te retribuir. É sobre o homicídio de ontem.
- O que que tem?!
- O negócio tá esquentando. A guria veio de São Paulo.
- Pois é. Ela trabalhava lá, né?
- Sim. Mas ela veio escondida de lá.
- Como assim?
- Ela fugiu de lá. Só a mãe e uma amiga sabiam que ela estava aqui.
- Hummm, estranho. E mais alguma pista? Foi encontrado mais alguma coisa no apartamento? Digitais?
- Sem digitais. Isso que é estranho.
- Significa que foi algo planejado?
- Exatamente!
O caso me chamava cada vez mais a atenção. Comecei a desconfiar de que aquilo era apenas uma pontinha do que estava por vir.
Descobri a agência dela em São Paulo e fui na sede de Porto Alegre me fingindo de cliente.
Uma gordinha simpática me recepcionou. Era uma casa antiga, reformada, num bairro nobre. Na sala de espera algumas meninas, de uns 16 anos no máximo, com suas pastinhas em baixo do braço.
Pedi a modelo pelo nome. Falei que já conhecia o trabalho dela e que queria ela na minha campanha.
- Ela está em São Paulo.
Disse a gordinha.
- São Paulo, é? E como entro em contato com ela?
- Nós fazemos isso pro senhor.
Muito estranho. A agência pensava que ela estava em São Paulo ainda.
- Nós entramos em contato com o senhor.
- Ok. Muito obrigado.
Quando estou passando pela sala de espera, alguém me chama:
- Renato!
Olhei para o lado e vi aquela morena espetacular com um sorriso para mim.
- Márcia?
- Oiii! Como tu estás?
A Márcia tinha sido minha namorada há um ano e meio, mais ou menos. Ela estava linda!
- O que tu tá fazendo aqui?
- Me chamaram pra um trabalho. To defendendo a minha. E tu? O que fazes aqui?
- Eu...tô trabalhando numa agência de publicidade.
- Deixaste o jornal?
Engoli seco.
- Pois é...não dava mais.
- Sei como é.
Vou ter que voltar aqui mais tarde. Tu estás muito ocupado? Queres tomar um café comigo?
- Não. Quer dizer, não estou ocupado. Vamos sim!
Saímos e fomos para uma cafeteria ali perto. Falamos da vida. Dos nossos 18 meses separados e o que havia acontecido em nossas vidas naquele período.
Relembramos velhos tempos. Ela estava solteira. Teve um namorado depois de mim, mas não deu certo. Assim como os meus cinco últimos relacionamentos.
- Mas me conta, e essa vida glamurosa de modelo?
- Quem me déra! É muito corrido. Teste pra lá, teste pra cá. Sem falar nas horas esperando numa salinha apertada e não conseguir nada.
- Haaa, mas tem seu lado bom.
- Tem, é claro. Mas é uma vidinha bem estressante. Fico com dó dessas guriazinhas de quatorze, quinze anos que entram nessa sem saber nada da vida. Eu já sou macaca velha, já sei me cuidar. Daí vão essas menininhas pra São Paulo, Rio, ficam longe das mães, e extremamente vulneráveis.
- Vulneráveis?
- Tu não sabe a podreira que rola nesse meio. Conheço gurias que subiram e viraram garota de luxo.
- Sério? Mas como acontece?
- Dinheiro, meu querido. Trezentos, quatrocentos, e até mais por programa. Tu volta de lá rica.
- E as agências? Não fazem nada?
- Elas estão no jogo. Elas ganham muito com isso.

CONTINUA...
por Lucas A.
continuação... HIPOTECA CEREBRAL | Parte III
Quanto mais entrávamos na floresta, mais perigoso e difícil era o acesso e mais quente ficava. Isso tudo era diretamente proporcional à encheção do Juliano:
- Pô Lucas,...me quebra um galho aí, vai...
- Vou te quebrar a cara, filho da puta!
- Bah, sacanagem. Tá me dando uma fome...
- Cala a boca!
- Por que tu fala ass...
- Cala a boca! Escuta!
Nããã nã nããããã
Lá lalalalá
- O que é isso?
- Vem de cima daquela árvore.
- Tô me cagando!
- Tu é um cagado, gordo bixa! Pega uns pedaço de pau... Faz silêncio.
Olhamos para cima, no alto da árvore, e avistamos um menino. Ele nos olha e desce até nós:
- Olá!
- Quem é tu?
- Sou Xisto.
- Xisto? Que nome estranho.
- Bah...eu me lembro de um nome assim. Daqueles livrinhos da “Coleção Vagalume” que a gente lia no colégio...
- Isso mesmo. Sou o Xisto!
- Como assim?
- Sou o personagem do livrinho. Já fui para o espaço, para o fundo do mar...agora estou na Floresta Amazônica.
- Uaauuuuu!
Definitivamente o gordo era fã do Xisto.
O Xisto estava ali na floresta há uns três anos. Ele conhecia cada folha daquela região. Ele era amigo de uma tribo que tinha reserva ali perto. Nos levou até lá para que pudéssemos comer e passar algumas noites.
- Silêncio......estão vendo aqueles arbustos?
- Sim, Xisto.
- Não são arbustos. São os Caniguára.
- Cani o quê?
- Caniguára. São os índios que te falei. São gente boa, muito hospedeiros. Tiveram pouquíssimos contatos com a civilização.
- Gordo, tira essa roupa!
- Não vou tirar, não!
- Os índio vão pensar que tu é louco, sei lá o quê? No meio da floresta, deve estar uns 35º e tu vestindo um Guanaco inteiro.
- Não vou me desfazer daquilo que me salvou a vida!
O Juliano tinha dessas. Era muito, como eu posso dizer, otário, imbecil, burro mesmo. Ele não queria se desvincilhar daquele pála porque por sua causa que o gordo não morreu de frio na cordilheira.
- Aumaiê aìee colunmo...
- Auiname rassum lamuno
O Xisto sabia falar como os índios. Eram uns índios baixinhos, barrigudos. Eles ficaram cheirando o gordo. Aposto que nunca viram um animal parecido com aquele Guanaco Obeso no meio da selva.
Fomos até a aldeia. Eles gostam muito do Xisto. Nos receberam muito bem. Um monte de indiazinhas gostozas, nuas, em volta de gente. O Juliano estava apavorado. Nunca viu uma mulher pelada tão de perto.
O Xisto nos levou pra conhecer o cacique. Gente fina o cara. Gostou de mim à primeira vista, ao contrário do gordo. Ficamos horas conversando e comendo. Tinha muitas frutas, carne e uns mingauzão que eu nunca vi igual. O gordo tava detonando. O cacique já tava olhando feio pra ele.
- Ô gordo, pega leve. O cacicão já quer a tua cabeça.
- O que eu fiz? Só tô comendo...
- Tu tá avacalhando com a ceia do cara. Eles vão ter que caçar em triplo pra encher essa tua pança!
- Tá meu, relax....
Eu odiava quando o gordo dava de arrogante e vinha com palavras estrangeiras.

CONTINUA...
por Lucas A.

dezembro 26, 2001

ASSASSINATO | Parte 1

Sete horas da manhã. Acordei com aquele gosto de guarda-chuva na boca por causa da bebedeira depois do trabalho na noite anterior. Tomei um banho e fui para a cozinha tomar café. Por que ainda não lavei aquela bendita panela com o fundo repleto de macarrão grudado que há uma semana ocupa espaço na pia?
Já estava atrasado, para variar. Peguei o ônibus às 8:20h, cheio. Nenhuma alma gentil se ofereceu para levar a minha pasta que estava me torcendo a coluna.
Entrei na redação escondido. Passei no arquivo, peguei uma pilha de papéis só para fazer de contra que eu já havia chegado ao prédio há uma hora.
- Renato, preciso falar contigo!
Era o meu chefe. Droga, será que ele vai encher meu saco por causa do horário? Não agüento mais! Faço de tudo nessa droga, almoço em meia hora, tenho que agüentar esses malas da redação e ainda, estou morrendo de dor de cabeça.
- Fala, seu Jorge.
- É o seguinte, hoje tu apronta uma matéria pra policial. Houve um homicídio na Garibaldi. Vai pra lá e te vira. Depois mando o fotógrafo.
Policial não! Meu negócio é falar do governo, pegar no pé de gente se acha importante. Mas policial?! Vagabundo não é mais comigo!
Peguei o carro e fui pra lá. Cheguei na frente do prédio e avistei uma viatura do IML. Fui entrando e encontrei um conhecido dos velhos tempos que eu tinha ajudado certa vez. Problemas de mulher...
- Grande Ricardo!
- Fala Renato! “Detetive” Ricardo!
- Mas áaaa...E aí, como vão as coisas? E a Cláudia?
- Nos separamos, sabe como é?
- Não brinca!
- Sério. Tô morando sozinho. Não tenho nada no apartamento. Só uma geladeira, um fogão e um sofá. Tá russa a coisa.
- Que decaída, hein? E o que tu encontrou aqui?
- Tu não viu ainda?
- O que?
- O presuntinho lindo que tá enrolado no tapete?
- Posso ir lá?
- Vai firme. O pessoal já foi embora.
Subi no terceiro andar. A porta estava aberta. Era um prédio simples. Os apartamentos pequenos. Passei pela porta azul. As paredes da sala eram pintadas de um amarelo “pintinho”. Coisa de mulher.
- Quem é você?
Olho para trás e tem um baita crioulo me encarando.
- Ôpa, sou repórter. Já falei com o Ricardo...quer dizer, Detetive Ricardo e ele me deixou subir.
- Ok.
O apartamentinho era bem decorado. Tinha vários quadros, algumas esculturas e uns porta-retratos. Segui o cara do IML até o quarto onde estava o cadáver.
- Judiaria, hein?
- O quê?
- A moça. Judiaria.
Entrei no quarto e vi um corpo semi-nu, perto da cama, havia sido desenrolado de um tapete pelos policiais. Cheguei perto para ver os detalhes, quando vi um rosto angelical, branco, com os olhos semi-abertos. Ela deveria ter no máximo 22 anos. Um corpo lindo.
- Nossa! Como aconteceu?
- Foi homicídio. A mãe dela comunicou a gente. A guria não tinha aparecido mais. O carro na garagem, nenhum movimento. Falamos com o advogado que também não sabia de nada. Conseguimos autorização e entramos aqui. Encontramos ela enrolada no tapete.
- E algum sinal de briga, drogas? Como ela morreu?
- Foi estrangulada. Encontramos pó na mesa. Ela cheirou bastante antes de morrer. Ou ela ou o cara que matou.
- Foi um homem?
- Provavelmente. Tinha que ter muita força pra fazer o que fez.
Descobri que ela trabalhava como modelo. Tinha voltado de São Paulo há umas semanas. Mas até aí a polícia não tinha nenhum suspeito. Ela não tinha namorado e as amigas não sabiam de nada.
Voltei para a redação. Escrevi um texto mas eu tinha poucas informações ainda. Nem a polícia sabia ao certo o que tinha acontecido. Esperei o outro dia.

CONTINUA...
por Lucas A.

dezembro 20, 2001

continuação...KÁTIA, A PATY VIRGEM | Parte II
Até que um dia, não agüentando mais e vendo que nunca iria ser traçada, ela resolve falar com o “bonitinho” da turma:
- Oi Dé!
- Eae Kátia?
- Posso te fazer uma pergunta?
- Aaa Kátia, não vem me perguntar de novo em que eu penso quando me masturbo!
- Dãrrr, nada a ver! Dé, olha só...tipo...tu já teve namorada, né?
- Claro!
- E...tipo assim, vocês transavam?
- Sim, Kátia. O que que tu quer?
- Ai Dé,...promete que não fala pra ninguém?
- Fala aí, Kátia.
- Todas as minhas amigas têm namorado e a maioria não é mais virgem. Eu quero perder minha virgindade. Eu sei que é um negócio súuuuper especial. Por isso, eu queria que fosse com um carinha bonitinho...tipo assim...como tu!
- Bah! Kátia, que cara de pau! Tu qué que eu te coma?
- Aii, não fala assim! QUERO!!!
- Bah...mas...sei lá.
- Eu já pensei em tudo. Meus pais vão viajar na sexta e voltam só no domingo. Meu irmão vai pra casa dos nossos tios e eu disse que iria dormir na Paty. Tu vai lá em casa sábado e a gente vê uns filmes, sei lá.
- Tá Kátia, mas o que eu ganho com isso?
- Ái, seu grosso! Tu vai ser o meu primeiro.
- Tá, e aí? Sem falar que a tua casa é bem longe da minha.
- Tudo bem...te pago o taxi...dé real!
CONTINUA...
por Lucas A.
KÁTIA, A PATY VIRGEM
Kátia era uma adolescente obesa ninfomaníaca que como todas as meninas de sua idade tinha o desejo de ao acabar o segundo grau, fazer sua formatura e ir viajar com a turma para João Pessoa.Com meses de antecedência sua mãe já havia começado a tomar as iniciativas para o tão esperado dia.
Faltava uma semana para a consagração e Kátia estava ansiosa:
- Alô?
- Sim.
- A Paty por favor, tio.
- Só um minuto. Quem deseja?
- É a Katinha!
- Oi Kátia. Como você está? Preparada para sábado?
- Bah tio, estou súuuper ansiosa!
- Fica tranqüila........a Paty tá vindo.
- Oiiiiii amiga!!!! Como estão os preparativos?
- Aii Pá, experimentei o vestido hoje pela manhã e acho que não “cabeu”. Será que vou me formar de calça jeans?
- Dããrrrrrr...claro que a tua mãe vai dar um jeito. Não te preocupa.
- Será Paty? Mas o que me preocupa mesmo é que nunca tive um homem pra mim.
- Aiii, guria! Não fala assim! E o Dézinho?
- Pois é. Mas eu não te contei...
- O que?
- Eu dei dé real pra ele me tirar a virgindade.
- SÉRRIOOO?!?!?!
- Ai amiga, não conta pra ninguém. Nós somos quaaase irmãs!
- Claaaro...eu juuuro que não conto.
- Pá, eu tenho que ir no shopping comprar um sapato, na volta te ligo.
- Tá...um bêijo!
Tututu...
O que mais preocupava Kátia era a aversão que os meninos tinham à sua pessoa. Não que seja aversão, era verdadeiro nojo. Ela chegava na escola levada pela sua mãe com a Cherokee e dava um “Súper oii” para as amigas, como ela mesmo dizia.
A Kátia era gordinha. Não, a Kátia era uma baleia mas tentava disfarçar com as roupas. Roupas largas? Não!! Extremamente justas, como se tivesse o corpo perfeito. Ela adorava sua coleção de “fusôs” pretas e sua infinita gama de jeans “centropê”. Isso sem falar nas mini-mini blusas que realçavam todo o seu poder “pneumático”.
De manhã, antes de ir para a escola, ela fazia chapinha no cabelo, botava as jóias douradas de sua mãe, prendia a juba para trás com um fiapinho de cabelo caindo de cada lado do rosto, pegava sua bolsinha Vitor Hugo e mastigava um Babaloo Melancia.
- Cris?
- Oiii amiga!
- Tenho uma múuito SHOW pra te contar!
- Aiii, fala! Peraí, deixa eu baixar o cd do N’Synk.
- A Kátia pagou o Dézinho pra comer ela!
- O quê? Pagou?
- Isso mesmo. Ela acabou de me contar. Mas não fala pra ninguém, viu. Eu jurei pra ela que era segredo.
- Claro...
Um ano antes Kátia estava sozinha em casa de noite com seu irmão, quando resolve ver pela centésima nonagésima oitava vez Titanic no DVD do quarto de seus pais. Procurando o controle da TV, ela encontra uma caixa atrás dos casacos de pele de sua mãe:
- Ai, que súuper!!! O que será que tem nessas fitas?
Ela liga o video-cassete e se deita na cama. As fitas revelam todas as fantasias sexuais de seus pais filmadas pelo próprio casal. Kátia se aterroriza, mas não consegue tirar os olhos da fita “3 B”.
- Aii, essa é muuuito dez. Olha quanta gente junta!
Começa a despertar em Kátia algo jamais sentido antes: um tesão incontrolável que lhe tirava o sono. A partir daí ela passou a tomar uma atitude promíscua.
Começou a fazer trabalhos em grupo só com os seus colegas homens, inventava festinhas na sua casa nos fins-de-semana quando seus pais iam para a serra, entrava, “por engano”, SEMPRE no banheiro dos meninos...
CONTINUA...
por Lucas A.

dezembro 10, 2001

continuação...HIPOTECA CEREBRAL | Parte II

O Juliano levou uma coronhada de rifle no estômado que fez ele se ajoelhar. Quando me abaixei pra juntar o gordo, levei uma porrada na cabeça e desmaiei.
Acordei uma hora depois dentro de um caminhão. Minha cabeça doía muito. Estávamos presos. O gordo do meu lado rezando. Prisioneiros sentados como nós. Um guarda armado na porta do caminhão estava nos olhando.
- Gordo, o que tá acontecendo?...
- Lucas? Tu tá bem?
- Tô, cara! O que houve? Quem é essa gente toda?
- Eles nos prenderam...não sei por que. É tudo prisioneiro como a gente. Vai dizer que aquele ali não parece o padre Marcelo?
- É mesmo!
Nisso, começa uma discussão no fundo do caminhão. Dois prisioneiros conseguem derrubar o guarda e todos nós pulamos do veículo. Todo mundo começou a correr em diversas direções. Eu ainda estava um pouco grogue por causa do golpe na cabeça.
Ouvimos, ao longe, o som de um carro no deserto. Ele foi se aproximando. Vimos que não era carro do exército. Parecia esses carros antigos argentinos, cheio de tapetes em cima. Acenamos e o carro se aproximou e parou perto de nós. De repente, para a minha surpresa, desce do carro alguém com um rosto muito conhecido:
- Ramirez!!!!
- Lucas?
- Ramirez, o que tu tá fazendo aqui?
O Ramirez era o porto riquenho que eu descobri que morava dentro das paredes do meu apartamento dois anos atrás.
- Yo estoy envolvido com negocios de tapeçarias.
- Incrível, cara! Tu tá indo pra onde?
- Estou cruzando o deserto para chegar na Arábia.
- Arábia?!?! Nos dá uma carona? É lá onde está o resto do pessoal do grupo de pesquisa...
- Claro...adelante!
Contei a história pro Ramirez. Ele quase não acreditou. Nos contou que a OTAN havia bombardeado Bagdá no início da manhã e o Sadam estava muito puto. Estávamos agora no Irã.
Chegamos na Arábia. Passamos na fronteira sem problemas por que o capitão é conhecido do Ramirez. Na capital, nos encontramos com o resto da nossa equipe que não tinha notícias de nós desde o bombardeio.
Tivemos uma semana para nos recompor e esperar a crise no Oriente dar uma esfriada. Mas fria mesmo é o que estava por vir. A pesar de tudo, não podíamos deixar o projeto. Tinha a segunda parte. Viajamos da Arábia direto para o Perú. Fomos subindo a cordilheira, passando por Kotshabamba, Cusco, eté chegarmos ao lago Titicaca.
Era lindo. O lago mais alto do mundo. Aquela paz, aquela natureza exuberante, e aquele frio! Muuuuiiito frio! O gordo não parava de tremer. Comprou quilos e mais quilos de roupas típicas com lã de Guanaco.
Fizemos muitas análises do solo e da água e levantamos as possibilidades da tubulação agüentar umas cinco toneladas/segundo de água passando por cima da Amazônia, a uns 500m de altura e uma extensão de uns oito mil quilômetros.
Passamos cinco dias no Perú e começamos a descer a cordilheira no lombo de jumentos andinos a fim de fazer todo o trajeto até o sertão brasileiro a pé para uma total análise das condições para a execução do projeto.
Vinte dias se passaram e nós já estávamos entrando na floresta. O gordo começou a encher o saco:
- Pô cara,...me ajuda aqui. Comprei muita roupa e não tô conseguindo carregar tudo.
- Te rala, gordo troxa! Joga fora o excesso.
- Não mesmo, eu comprei. Paguei muito pra não passar frio.
- Gordo otário, mão-de-vaca!

CONTINUA...
por Lucas A.
HIPOTECA CEREBRAL Parte I

Era 1992. Eu e o gordo Juliano fazíamos parte de uma equipe que tinha como objetivo desenvolver um projeto para encanar as águas do lago Titicaca e trazer, sobre a floresta Amazônica, ao Brasil para irrigar o sertão nordestino. Estávamos em Bagdá, na cede de uma petrolífera assistindo uma palestra sobre “o processo cinérgico de conexão das roldanas 5cc sem para-apoio reconstrutivo”. De fato era uma palestra muito interessante.
As nove e meia da manhã a palestra é interrompida pela sirene de ataque aéreo. Todos começaram a correr e a gritar conosco a fim de descermos para o bunker:
- Ramahlahh , ssschirin!!!!
- O que está acontecendo Lucas?
- Porra, não sei. Que merda!
- Para onde eles estão nos levando?
- Cacete!!! Não sei, ô imbecil!
- Ô meu, eu tô com medo!!!
- Gordo de merda, cagalhão!!!
Ouvimos o barulho das turbinas de um F-16 e tiros das baterias anti-aéreas. Logo mais, uma grande explosão e silêncio absoluto. Nos perdemos de todo mundo. O gordo se escondeu no banheiro e eu tive que ficar uns quinze minutos tentando convencê-lo de que aquilo era “normal” e já tinha acabado.
Não havia mais ninguém no prédio. Os corredores estavam vazios. Ouvimos um ruído, como de um rádio. Seguimos o som e chegamos até uma guarita vazia, onde tinha um radinho a pilha que estava transmitindo um discurso de Sadam Russein.
Chegamos na rua. Deserta. O gordo tava apavorado:
- Lucas, eu tô com medo!
- Cala a boca e vamos tentar achar alguém!!!
Andamos uns vinte minutos e não encontramos ninguém. Haviam uns carros pegando fogo e alguns prédios destruídos, mas ninguém nas ruas.
Tã tã tã nãnã piiiii nã nã nã
- Que barulho é esse?
- Vem detrás daquele muro.
- E agora?
- Vamo lá vê! A gente têm que achar alguém pra poder sair daqui. Dá um pezinho, gordo.
Olhei por cima do muro e vi um soldado bigodudo jogando “Pense Bem”.
- O que que tu tá vendo, Lucas.
- É um cara jogando Pense Be....
- Rahmalahhh!!!
- Calma, calma, não atira!
- Ramalah, trinutuh ranlim!!!
- Calma, ease!!!! Please!!! We are brasilianos!!!!
- Ramalahhhh ranlim!!!!!! Americanos!!!!
- No, no! We are brasilianos! Brasil!
- Brazil?
- É...feijoada, caipirinha....Pelé.
- Pelé!!! Mulata, Maradona!
- Que Maradona o cacete, iraquiano filhadaputa!!
- Lucas, não xinga o cara! Ele tá armado!!!
- Maradona é o cacete!
- Rimnham....Ronaldin...
- Isso, Ronaldinho!
Vi que o gordo já estava se entendendo com o cara. O iraquiano já tinha baixado o rifle e esboçava um sorriso. Só que o gordo se emocionou demais:
- Ronaldinho, Felipão, Zico...
- Rahmalahhh!!!
- O que tu disse pra ele, gordo desgraçado?
- Não sei, cara! Calma senhor!! Ronaldinho, Felipão, Zico...
- Rahmalahhh!!! Rahmalahhh!!!
Kusshhhhhhhhh

CONTINUA...
por Lucas A.

dezembro 06, 2001

continuação...A VIAGEM
os outros capítulos dessa história se encontram em posts anteriores.

As luzes do ônibus acenderam, o motorista abriu a portinha que isola ele do corredor e gritou:
- Quinze minutos!
Todos levantaram, inclusive o gordo, para se esticarem um pouco. Não fiz diferente, eu estava com fome e precisava ir ao banheiro. Desci do ônibus e vi mais uns dez iguais ao meu parados na frente do restaurante.
Entrei e uma mocinha me alcançou a “comanda”. Olhei aquela enorme fila para se servir que andava muito devagar. O urso gordo estava lá, com uma bandeja cheia de salgados e recarregando o copo de suco direto da máquina.
Não encontrei nada que me agradasse o apetite. Acabei chegando junto no pão de queijo. Peguei o copinho plástico e me servi de suco de laranja de máquina. Laranjada das mais fraquinhas. Saí da fila e fui procurar um lugar para sentar. De preferência muito distante do meu vizinho de acento.
Dei minha primeira mordida no pão de queijo: que horror! Tinha gosto de sabão e ainda me queimou a boca. Dei um talagaço no suco para aliviar a dor e foi pior, pois a laranjada estava morna. Nessa hora eu já estava ficando preocupado com o motorista. Procurei ele pelas mesas e tive um alívio quando o encontrei, lá no fundo, devorando um pastel. Pense:
- Quando ele levantar, vou junto e não perco o ônibus, de novo!
Lá! Levantou o motora! Vou nessa. Guardei o outro pão de queijo num guardanapo e fui para a fila. Bendita hora. A fila não andava. Aquela senhora quis pagar cinco reais em moedas de dez centavos, e o pior é que ela contava em cima do balcão. Comecei a ficar impaciente.

CONTINUA...
por BYROCAI

dezembro 03, 2001

NAS ENTRANHAS DO LAR

Fazia horas que a minha mãe me pedia para pendurar aquele quadro na parede:
-Pô, guri!...já te pedi umas mil vezes pra tu pendurar essa merda aí!
-Bah, mãe, foi mal. Eu me esqueço.
-Ahã....pra sair poraí correndo china tu tem memória, né, seu cretino.
-Tá mãe. Não enche o saco!
Peguei um prego e um martelo e comecei a furar a parede.
Páaaa
Páaaa
-Hummmmmmmm!
-Ahhh, guri! Martelou o dedo?
-Que dedo, mãe...não viaja! Tu que tá me sacaneando.
Páaaa
-Hummmmmmm!
-Ô guri, mas tu não sabe nem pregar um preguinho?!?!
-Sai fora, mãe. Me deixa em paz! Que barulho é esse? É tu?
Páaaa
Páaaa
-Hummm, aiiiiiiii....aaaaaaaaahhhhh!
Nisso um filete de sangue começa a escorrer do buraco do prego.
-Manhêêêêê!!!!!!!!!!! Vem cáaaaaaaa!
- O que tu qué, guri?
- Olha isso aqui!
- Que é isso?? Tu te cortou?!?!
- Cala a boca mãe...tá escorrendo da parede!!!
- Não fala besteira!
- Sério! Tô me cagando!!!!!!
- Me dá isso aqui!
Páaaa
Páaaa
- Hummmmmmmmmm........
- Aaaaaaaaahhhhhh...o que é isso? Tá vindo aí de dentro!!!
- Me dá aqui o martelo!
Páaaaa
Páaaaa
Páaaaa
- Guri! Olha o que tu tá fazendo com o reboco!
- Cala a boca, mãe. Me traz a marreta!
- Tu tá loco?
- Porra, mãe! Tu não tá vendo que tem alguém aqui atrás????
- Ai, guri. Não me assusta!
- Porra! Busca a merda da marreta logo.
Nessas alturas a parede já estava toda rachada e encharcada de sangue.
Bhouuuuum
Bhouuuuum
Bhouuuuum
O apartamento todo tremia com as minhas marretadas. Minha mãe histérica, estava gritando comigo com medo da parede toda cair.
- Porra, mãe! Tu tá preocupada com a merda da parede? Não te ligou que tem alguém aí dentro?!?! Pára de chorar!!!!
Bhouuuuum
Bhouuuuum
Consegui abrir um buraco. Dei uma espiada e ví um vulto.
- Mãeeee! Busca a faca! Tem um cara aqui!
- Desculpa me señor! Yo no tenho...
- Que é isso?!?!?!?!
- Mãeeeeee , a faca! Tem um argentino aqui!!
- Señor....perdon....no machuca me....
- Pega guri...!!!
- Ok....quen és tu? Mãe, fala com o cara!
- O que vou falar? Vou chamar a polícia!
- Espera, cacete! O cara tá mais cagado que eu! Qual tu nombre?
- Desculpaaa sssssseñor!!!!
- Espere! Quen és tu?
- Yo soy Ramirez. Te vou contar...no machuca me!!!!!
- Calma, sai daí. Se tentar alguma coisa eu te detono na marretada!!! Mãe, pega a faca. Qualquer coisa, fura o paraguaio!
- Não faz isso, eu tô com medo!
- Porra, mãe! Cala a boca!!! De onde tu veio? Como tu veio parar aí dentro? Tu é ladrão? Vou te quebrá!!!
- Yo soy de Puerto Rico.....yo queria vir para América....
- Que América o cassete!!!! Isso aqui é Brasil, porra!
- Brasill?!?! Acá ser Brasil?!?!?!?!
- É, uruguaio...onde tu pensa que tá?
- Espere senõr...te contarei! Yo estava em puerto del Porto Rico com mi primo Raul. Iríamos nos esconder num navio de uma empreitera americana para poder entrar na América. Acá é Brasil?!?!
- Cacete mesmo! Esse chileno perdido aqui! Mas como tu tá dentro da minha parede?!?!?!
- É porto-riquenho, guri!
- Não me interessa!!! Como tu tá aí dentro?!?!
- Nós dormimos no navio que ía pra América...no sei o que aconteceu!
- Colombiano filho da puta!
- É de Porto Rico, guri burro!
- Há quanto tempo tu tá aí?
- Yo no sei mucho bien. Creo que há dos años!
- O quê??? Dois anos dentro da minha parede??? O que tu faz aí??? Tá sozinho???
- Yo y mio primo hacemos video-cassetes...
Depois de muita trova e quase esganar o cara, descobri que na verdade, ele queria entrar escondido nos EUA. Ele e o primo, viajaram clandestinos num navio de uma empreiteira americana que fechou suas filiais no Brasil. De alguma forma o barco, ao invés de ir para os EUA, veio pra cá. E eles estão aqui há dois anos e três meses pensando que isso aqui é a Porra da América!
Eles só saem de noite, por isso não falam com ninguém. Falaram até hoje só com um paraguaio que tem uma fabriqueta de aparelhos falsificados que em troca da mão de obra, lhes dá comida. O paraguaio, muito filho da puta, sacaneou eles dizendo que estavam nos EUA e a imigração já sabia deles. Eles desceram no porto e vieram no caminhão da empreiteira direto pra cá, e se esconderam dentro das fundações do prédio. Acabaram terminando a obra e os dois morando aqui dentro.
Acabei ficando amigo do cara. Era gente boa. Humilde. Fizemos os curativos na mão dele, que eu tinha furado na hora de pregar o prego. Ele tá melhor, agora.
Encontramos o primo dele, o Raul. È meio desconfiado. Saímos com eles durante o dia pra pegar um sol. Faz tempo que eles não andavam na rua durante o dia. Conseguimos uma pensãozinha pros dois e largamos umas fichas de emprego, inventadas, em algumas agências. Os caras sabem muito de eletrônica. Também, fazendo vídeo cassetes manualmente.
por Lucas A.
APUROS

Depois do churrasco, enquanto uns resolveram tirar um cochilo na porta da garagem, ele pega um Correio do Povo de duas semanas e adentra ao banheirinho no fundo da peça. Lá era um lugar agradável – arejado, claro, limpo, quieto, isolado – para liberar o fruto de sua digestão.
Desce a tampa do vaso e olha em volta, verificando se não há nenhuma perereca perdia por detrás da patente, pois seria um grande susto sentir aquela barriga gelada do anfíbio lhe tocar as nádegas. Não havia nada. Tudo tranqüilo. Pronto para o trabalho. Se aconchega no trono e começa a folhear o jornal.
Pensando na vida, ele é interrompido pelo ronco do pai e das duas irmãs adolescentes de seu amigo – o dono da residência – que o havia convidado para passar aquele fim-de-semana na sua casa de praia. Mas isso não era nada. Roncos não perturbavam seu trabalho.
Passados uns trinta minutos, ele acaba a tarefa e começa a se recompor para continuar a vida. Surge uma pequena preocupação: o banheiro é bastante arejado, mas até que ponto essa qualidade da peça não influenciará, depois de tê-lo usado, no sono do proprietário que dormia dali uns cinco metros? Olhou em volta e, surpreendentemente, avista uma vela e uma caixinha de fósforos que a mãe de seu amigo, por precaução, botou na janelinha do banheiro para caso faltasse luz e alguém estivesse ali dentro. -“Hummm, fósforos.”
Jogou o palito no lixo e deu uma espiada para o fundo da patente. “Nossa!”. Deu um pulo pra trás ao ver o sei “filhinho”. Aliviado, sabendo que tudo aquilo tinha deixado de fazer parte de sua massa, puxou a cordinha da descarga e esperou o “cramulhão” sumir no redemuinho formado pela água que escorria na louça azul. Foi-se a água, ficou o indivíduo. Era um bichano muito saudável, forte e que não queria saber de ir embora. Esperou a caixa da descarga carregar de água novamente para poder , finalmente, dizer adeus àquela sua cria.
Nada! Era a segunda descarga e nada do cramulhão se mexer. O problema agora não era mais o cheiro, mas sim o barulho que a descarga fazia. Também o tempo que estava ali. Já se passavam quarenta e cinco minutos desde sua entrada.
Ele começou a ficar nervoso. Como sair dali, daquele jeito, deixando aquela “baita matéria” presa no fundo da privada? Sabendo que viraria chacota, pior, mesmo que ninguém falasse, saberiam todos que ele era o autor de tão gigantesca obra.
Tentou mais três vezes e o animal não desistia. O que lhe tomava grande tempo era a espera para encher novamente a caixa da descarga. Ele não podia ficar mais tempo ali dentro. Daqui a pouco uma irmã de seu amigo poderia querer entrar para passar bronzeador nas costas utilizando o espelho atrás da porta ou qualquer outra coisa. Tinha que pensar rápido. Tinha que, urgentemente, sair dali.
Olhou em volta e não havia nada. Nem chinelo velho, nem desentupidor de vaso para poder esgrimar com o fiel escudeiro intestinal que estava a sua espreita. Já tremendamente nervoso, olha para o box. Não encontrou nada no chão. Olha para cima e também nada. Até que avista a mangueirinha do chuveiro. -“Grande idéia!”
Com um só golpe ele desconecta a mangueira do chuveiro e analisa a possibilidade de enforcar o indivívuo. Pensado e feito. Faz um laço e, como um experiente laçador, laça o cramulhão e o aperta, dividindo aquele ser em duas partes.
Agora, a parte mais importante – a descarga! Iria a descarga nesse momento, na atual conjuntura dos fatos, dar conta do bichano dividido? Com muita fé, ele dá um golpe na cordinha e vibra quando vê que o animal não resistiu à fúria das águas.
Feliz e muito mais tranquilo, ele molha a cabeça e abre a porta do banheiro fazendo de conta que a demora era devido ao banho que tomara.
por BYROCAI